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Cuadernos del Centro de Estudios en Diseño y Comunicación. Ensayos

versión On-line ISSN 1853-3523

Cuad. Cent. Estud. Diseñ. Comun., Ensayos  no.83 Ciudad Autónoma de Buenos Aires set. 2020

http://dx.doi.org/10.18682/cdc.vi83.3736 

Artículos

O idoso, sua casa e suas coisas: contribuições para criação de um entorno mais acolhedor para os maiores de 60 anos

Marília Ceccon Salarini da Rosa1 

1 Designer, Mestre em Design e Doutoranda em Arquitetura pela UFRJ.

Resumo

No Brasil, vivenciamos o fenômeno inédito do envelhecimento populacional e da longevidade. Em menos de uma década o número de idosos ultrapassará o de jovens. Com essa nova realidade surgem também novos comportamentos, desejos e demandas. O presente artigo tem como objetivo trazer informações sobre relação de afeto do idoso com sua casa e suas coisas, e trazer subsídios para construção de um entorno mais adequado para aqueles que estão envelhecendo. Esse artigo está estruturado em 5 seções que apresentam: (1) o panorama demográfico e as tendências dos arranjos domiciliares de idosos no Brasil; (2) hipóteses trazidas de áreas distintas sobre a relação dos idosos com suas casas, (3) reflexões sobre a casa e os artefatos como suporte de memória e identidade; (4) a relação de pessoas idosas com suas casas e coisas de acordo com resultados obtidos em pesquisa qualitativa. Ao fim, espera-se prover um alerta aos profissionais envolvidos com a criação de ambientes, produtos e serviços, que levem em consideração os desejos, aspirações e sentimentos dos idoso, especialmente no que tange suas preferências sobre moradia. Dessa forma, o artigo soma-se a outros estudos que fornecem subsídios para aqueles que queiram desenvolver produtos, serviços e ambientes que atendam as demandas emocionais dessa população, proporcionando a eles mais qualidade de vida.

Palavra chave: Envelhecimento; Design Social; Arquitetura.

Resumen

En Brasil, vivimos el fenómeno inédito del envejecimiento poblacional y de la longevidad. En menos de una década el número de ancianos superará al de los jóvenes. Con esta nueva realidad surgen también nuevos comportamientos, deseos y demandas. El presente artículo analiza la relación de afecto del anciano con su casa y sus cosas, y propone subsidios para la construcción de un entorno más adecuado para aquellos que están envejeciendo. Este texto se divide en cinco secciones: (1) El panorama demográfico y las perspectivas y tendencias de la organización de la vida de las personas mayores en Brasil; (2) hipótesis traídas de áreas distintas sobre la relación de los ancianos con sus casas, (3) reflexiones sobre la casa y los artefactos como soporte de memoria e identidad; (4) la relación de personas mayores con sus casas y cosas de acuerdo con resultados obte-nidos en investigación cualitativa. Al final, se espera proveer una alerta a los profesionales involucrados con la creación de ambientes, productos y servicios, que tengan en cuenta los deseos, aspiraciones y sentimientos de los ancianos, especialmente en lo que se refiere a sus preferencias sobre vivienda. De esta forma, el artículo se suma a otros estudios que proporcionan subsidios para aquellos que quieran desarrollar productos, servicios y am-bientes que atiendan las demandas emocionales de esa población, proporcionándoles más calidad de vida.

Palabras clave: envejecimiento; Diseño Social; Arquitectura.

Abstract

In Brazil, we experience the unprecedented phenomenon of population aging and longevity. In less than a decade the number of the eldery will exceed the Young, with this new reality also arise new behaviors, desires and demands. The purpose of this arti-cle is to provide information about the relationship of affection of the elderly with their home and their objects, and to provide subsidies for the construction of an environment more suitable for those who are aging. This article is structured in 5 sections that present:

(1) the demographic panorama and the tendencies of the household arrangements of the elderly in Brazil; (2) hypotheses brought from different areas about the relationship of the elderly with their homes, (3) reflections about the home and the artifacts as sup-port of memory and identity; (4) the relation of the elderly with their houses and things according to results obtained in qualitative research. Finally, it is expected to provide an alert to professionals involved in the creation of environments, products and services that take into account the desires, aspirations and feelings of the elderly, especially regarding their preferences about housing. In this way, the article joins other studies that provide subsidies for those who want to develop products, services and environments that meet the emotional demands of this population, providing them with a better quality of life.

Keywords: Aging; Social Design; Architecture.

O panorama demográfico e as tendências dos arranjos domiciliares de idosos no Brasil

O aumento da fertilidade, os avanços da medicina, mudanças socioeconômicas e o surgimento de novas tecnologias proporcionaram à população atingir idades mais avançadas com qualidade de vida. Hoje vivenciamos o fenômeno inédito do envelhecimento popu-lacional e da longevidade. Essa nova realidade apresenta oportunidades e desafios para diversos setores de diversas sociedades, especialmente as que envelhecem rápido como a brasileira.

A proporção de pessoas idosas no mundo aumenta mais rapidamente do que a de qualquer outra faixa etária. Em menos de três décadas, seremos dois bilhões de pessoas com mais de 60 anos, representando quase 30% da população mundial (OMS, 2007; HelpAge, 2014).

No caso do Brasil, a diminuição da taxa de natalidade após longos períodos de crescimen-to populacional, junto ao aumento da expectativa de vida, foram fatores determinantes para o envelhecimento populacional e longevidade (Camarano, 2002).

Entre 1940 e 1960, o Brasil passou pela redução da taxa de mortalidade, mas a fecundidade continuou acelerada, o que gerou uma população jovem e de rápido crescimento. À partir de 1960, o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) passou a observar o constante aumento na proporção da população idosa. Nos últimos 50 anos, essa faixa etá-ria registrou aumentou consideravelmente. Enquanto em 1960, apenas 4% da população tinham mais de 60 anos, no ano 2000 esse percentual passou a ser de 8%, e, em 2010, de 10,8% da população nacional, totalizando um número de aproximadamente 15 milhões de idosos (IBGE). O Relatório World Population Prospect publicado pela ONU em dezem-bro de 2017, estimou que no Brasil mais de 13% da população já é idosa. A projeção indica que em 2020 o número de idosos ultrapasse o de jovens. A ONU pontua que no mundo, a quantidade de pessoas com mais de 60 anos vêm crescendo cerca de 3% ao ano, e que hoje eles já representam um contingente de 962 milhões individuos, compreendendo 13% da população global (ONU, 2017)

Além de ser um dos países mais populosos do mundo, com cerca de 209 milhões de habitantes (ONU,2017), o Brasil, estará entre os seis países com mais idosos do mundo. O Rio de Janeiro é o estado com maior proporção de idosos no país, seguido pelo Rio Grande do Sul. Em 2011 o IBGE alertava que no município do Rio de Janeiro, onde se deu o estudo que aqui será exposto, já se registrava um morador de 60 anos, ou mais, para cada 10 mo-radores do município (IBGE, 2011).

Ainda segundo a ONU, junto ao aumento do número de idosos no mundo estamos vivendo, também, o fenômeno da longevidade. A agência registrou em todos os continentes o ganho na expectativa de vida. No Brasil, em 2009, ela era de 69 anos, em 2010 aumentou para 73 anos e estima-se que em 2020 atinja a faixa dos 75 e 76 anos (Alves, Cavenaghi, 2012). “Uma criança nascida no Brasil ou em Mianmar em 2015 pode esperar viver 20 anos mais que uma criança nascida há 50 anos” (OMS, 2015).

Cabe destacar que dentro da faixa etária considerada idosa existe um grande intervalo de idades e consequentemente um grupo muito heterogêneo. Por isso, Camarano ressalta que “é comum desagregar esse segmento populacional em dois subgrupos etários: de 60 a 79 anos e de 80 anos e mais, esse último categorizado como “mais idosos”.

Neste segundo grupo, a medicina e a tecnologia são fatores que vêm contribuindo como aumento da sobrevida da população com mais de 80 anos. Em 1940, haviam 166 milidosos acima dos 80 anos e em 1996, esse número aumentou para 1,5 milhões (Camarano, 2002). E o último Cens registrou mais de 2,5 milhões de idosos acima de 80 ano (IBGE, 2010).

Junto aos números apresentados acima, é possível vivenciar e observar essa realidade ao nosso redor. Nas ruas, no transporte público, nas empresas, na nossa vizinhança e até mes-mo em nossas família já não é raro encontrar pessoas com mais de 80 anos e até centená-rias. Convivemos cada vez com mais idosos ao nosso redor. Todos os setores da sociedade são afetados por essa nova realidade que impõe um permanente estado de atenção ao surgimento de novos comportamentos, desejos e demandas desses indivíduos.

Atenta a essa questão, a OMS elaborou o Guia Global: da Cidade Amiga do Idoso, um documento que visa trazer informações sobre aspectos importantes da vida do idoso em áreas urbanas. Ele apresenta o resultado de pesquisa realizada com idosos, cuidadores e prestadores de serviços de 33 cidades ao redor do mundo. O objetivo do documento é trazer informações para a avaliação, identificação e promoção de aspectos que possibilitem, facilitem e melhorem a vida da população idosa nas cidades. Dentre os pontos abordados, cabe aqui ressaltar, o tópico dedicado a habitação, que alerta que o entorno -ambientes, produtos e serviços- não atendem por completo às pessoas que estão envelhecendo.

No contexto dos paises desenvolvidos e comum que idosos morem separado dos filhos, diferentemente do que acontece em paises em desenvolvimento como o Brasil, onde ainda muitos indivíduos idosos passam a morar com os filhos na velhice. Nos paises desenvolvi-dos ha tambem mais instituiçes disponiveis para os que precisam de cuidados especiais ou nao tem independencia (ONU, 2005), o que também contraria a realidade brasileira. Em resumo, a realidade de moradia dos idosos nos países da América Latina e Ásia ainda é predominantemente de co-residência de pais com filhos.

A ONU destaca que um em cada 7 idosos no mundo moram sozinhos e que existe uma tendência de que eles queiram manter a vida independente. Viver sozinho ou somente com o cônjuge indica ser uma preferência por modos de vida independentes em países desenvolvidos e em países em desenvolvimento também (ONU, 2005).

No cenário brasileiro, a residência de idosos com filhos é predominante, e em 86% dos casos eles assumem o papel de chefes da família. Nos últimos anos o Brasil vem registran-do aumento de idosos morando sozinhos, de acordo com dados do IBGE. O instituto, por meio da Pesquisa Nacional por Amostra em Domicílios (PNAD), divulgou em 1992, que 1,17 milhão de idosos moravam sozinhos no país e que em 2012 esse número chegou a cerca de 3,7 milhões, o que revela um aumento de 215% em 20 anos. Isso significa que a quantidade de idosos vivendo sozinho triplicou entre os anos de 1992 e 2012 (IBGE, 2012). No que se refere ao número de idosos moram em instituições de longa permanência, o Instituto de Pesquisa e Estatística Aplicada do Brasil (IPEA) indicou que estes somam aproximadamente 83 mil, o que pode ser considerado um número muito baixo compara-do ao número de idosos que optam por ficar sozinhos em suas casas (IPEA, 2011).

Proporcionalmente o número de idosos vivendo só é mais elevado entre os maiores de 80 anos. Dentre os idoso que moram sozinhos às mulheres são predominantes (IPEA,2002). A realidade global e, também, a brasileira aponta para estimativas de crescimento da po-pulação idosa. Ao envelhecer o indivíduo vai transformando sua vida e sua rotina e ten-dem a passar grande parte de seu dia no ambiente doméstico -principalmente com a aposentadoria (Caradec, 2016). E como apresentado aqui, os idosos brasileiros, seguindo uma tendência mundial estão escolhendo envelhecer em suas casas.

Hipóteses trazidas de áreas distintas sobre a relação dos idosos brasileiro com suas casas

Existem inúmeros fatores e hipóteses vindos de áreas distintas que podem elucidar às tendências dos arranjos domiciliares dos idosos no Brasil e no Mundo.

Sob o ponto de vista estatístico, a demógrafa Ana Amélia Camarano cita a perda de inde-pendência e questões financeira como fatores determinantes para o tipo de arranjo domi-ciliar do idoso brasileiro. A necessidade de ajuda para atividade básicas do cotidiano e a falta de recursos financeiros para se sustentar são decisivos para a escolha de moradia na velhice. Camarano ainda ressalta que nos casos de co-residência a dependência financeira dos mais jovens também acabam afetando os arranjos domiciliares. Pois a tendência é que os filhos permaneçam por mais tempo na casa dos país devido a fatores econômicos (Camarano, 2002).

Segundo a PNAD, as mudanças na constituição familiar, também, são grandes respon-sáveis por essa alteração estatística. Os organizadores das pesquisas relacionaram, por exemplo, o aumento da proporção de domicílios compostos por mulheres sozinhas com o resultado da transformação do papel social da mulher e o envelhecimento populacional. Ressaltaram ainda, que as alterações na estrutura etária levaram ao aumento da proporção de mulheres viúvas, que podem estar optando por viverem sozinhas, em vez de morarem com os filhos ou outros parentes (PNAD, 2014).

Sob o ponto de vista cultural, é possível constatar , uma mudança em relação a percepção e significado da família. O gerontólogo Alexandre Kalache (2013), pontua que o aumen-to da proporção de idoso morando sozinho é resultado da dispersão e fragmentação da família, com filhos muitas vezes morando em cidades ou até países diferentes. O Geron-tólogo também, destaca o fato dos idosos querem manter a autonomia, principalmente as mulheres que já criaram os filhos e ficaram viúvas.

A antropóloga Mirian Goldenberg, ressalta que a imagem da família era tida como fonte de segurança e felicidade. E a decisão de ter filhos, em muitos casos estava relacionada à segurança, amparo e companhia na velhice (Goldenberg, 2013). O idoso que mora com outra pessoa, seja um familiar ou não, passa a imagem de estar mais bem assistidos em caso de problemas de saúde (Ramos, Menezes e Meira, 2010). Goldemberg acrescenta: “A imagem de velho sozinho é associada ao abandono, desamparo, fracasso, insegurança. Os filhos são vistos como uma possível proteção contra a velhice solitária e infeliz, uma espé-cie de seguro contra velhice desamparada” (Goldenberg, 2013, p. 64).

No entanto, como bem pontua o relatório da PNAD: “Durante milênios, prosperidade e felicidade eram associados a uma descendência ou a um legado para a prosperidade (Pritcheet, Viarengoin at. PNAD, 2014). Hoje, prosperidade e felicidade caminham em direção oposta a uma família numerosa (PNAD, 2014)”. Em um artigo publicado mais re-centemente na revista Casa e Jardim, Mirian Goldemberg explica que durante suas pesqui-sas observou que os significados em torno da casa dos brasileiros veem-se modificando. “Antes, ela era considerada um lugar para dormir e comer, e as tarefas domésticas eram obrigações chatas e cansativas, feitas pela empregada ou pela dona de casa. Hoje, ela é um espaço de lazer, prazer e de criatividade”. Nesse sentido O Guia Global: Cidade Amiga do Idoso confirma que muitos idosos demonstraram apego a suas casas e o desejo de continuar a morar onde sempre moraram. Segundo o documento os entrevistados declararam preferir receber ajuda em casa a ter que se mudar.

Ainda sob o ponto de vista social, Caradec, sociólogo francês, elucida que nessa fase da vida há um conflito que afeta a identidade dos indivíduos:

[...]Na idade avançada, com efeito, a identidade está sujeita a duas grandes tensões. A primeira tensão -entre “ser” e “ter sido”- remete a questão de saber em que espaço temporal as pessoas muito idosas podem basear o sentimento do próprio valor -sua “autoestima”- para estabelecer uma relação positiva com ela mesma. [...] todavia, quando compromissos presentes diminuem, o passado torna-se o principal ponto de apoio para salvaguardar o sentimento do pró-prio valor… (Caradec, p. 30, em Goldenberg, 2016).

Nesse sentido o sociólogo francês, conclui que o idoso vive um conflito onde precisa lutar para preservar seu espaço de familiaridade com o mundo. Segundo ele, com o passar dos anos o idoso passa a ter o sentimento de não pertencer mais a sociedade em que vive, como argumento de que essa muda muito rapidamente. Nesse momento de estranhamen-to com seu entorno, segundo o autor, o idoso buscase cerca de ambientes com os quais tem familiaridade, e acrescenta:

[...] esse espaço é o espaço da casa. Diversas pessoas muito idosas valorizam fortemente o domicílio, que é, [...] ao mesmo tempo toca e referencial: uma toca onde se sentem protegidas das pressões externas; uma referência de identidade (o domicílio representa a pessoa em sua continuidade), espaço (ele é um espaço familiar, intimamente apropriado, de uso fortemente enraizado nos hábitos corporais) e tempo (pois está carregado de lembranças) (Caradec, p.33: in Goldenberg, 2016).

Nessa mesma direção Ferreira (1998), em seu estudo de campo com idosos da cidade de Pelotas, no estado do Rio Grande do Sul, constatou que a casa é ancoramento do passado do idoso e ferramenta que confere sentido ao seu presente. Ela identificou que com a mudança do papel social do idoso após a aposentadoria, reviver o passado através das lembranças evocadas pelos ambiente e objetos é afirmar e fortalecer a sua identidade:

A casa é o ponto central de um espaço simbólico criado a partir das vivências e temporalidades que evoca; nela, tempo e espaços articulamse, quando semantizada como o núcleo da aurora e do desabrochar da vida, palco de um tempo feliz; e o ato de retorno vem articulado com a ideia de reviver, através das imagem, fragmento desse tempo, o que confere sentido ao presente (Fer-reira, 1998, p. 217).

No mesmo sentido, Caradec aponta que os objetos do ambiente doméstico garantem a permanência do mundo entorno do idoso e assim preserva a sensação de estabilidade, contrapondose ao mundo externo, onde tudo muda. O autor ainda pontua que muitas pessoas que vivem em casas de repouso encontram a estabilidade quando se cercam de objetos -como fotografias, bibelôs e móveis de família-, garantindo assim conseguem criar um sentimento de “estar em casa” e restabelecendo m o equilíbrio. Sob o ponto de vista cultural, constatamos, hoje, uma mudança em relação a percepção e significado da família.

Assim como acontece em outras etapas da vida, observamos que a escolha de moradia do idoso não depende de um fator isolado, e sim um conjunto de eventos que influencia a forma de morar dessa população e consequentemente o seu bem-estar. Diante dos pres-supostos extraídos do cenário acima apresentado, este artigo entende e se vale do enve-lhecimento populacional como ponto de partida para a construção de um entorno mais acolhedor para aqueles que estão envelhecendo.

O design e a arquitetura como campos de desenvolvimento de projetos devem estar aten-tos às relações de afeto e significado que o idoso estabelece com seu lar, para assim criar ambientes e produtos que promovam seu bem-estar independente da sua escolha de mo-rar sozinho, com filhos, parentes ou cônjuge.

Reflexões sobre a casa e os artefatos como suporte de memória e identidade

O aumento da oferta de produtos domésticos e os avanços tecnológicos, como a luz elétrica, proporcionaram muitas transformações na forma de morar e no comportamento das famílias em suas casas. Os eletrodoméstico, por exemplo foram objetos que participaram ativamente dessas transformações, facilitaram a vida da dona de casa e proporcionaram novas configurações dos lares, Csikszentimihalyi e Rochberg-Halton (1981) citaram a im-portância da ciência e a possibilidade de transformar problemas humanos por meio da inovação tecnológica como uma das temáticas favoritas para eletrodomésticos e automóveis na América do Norte das décadas de 1950 e 1960 (Csikszentimihal Yi e Rochbeng--Halton, 1981).

Mesmo com a consolidação do consumo como prática comum de nossa sociedade e a mudanças sociais como aumento das jornadas de trabalho, e mulheres que passaram a ter uma rotina estabelecida de lazer e trabalho fora de casa, o lar continuou sendo o espaço de preservação da individualidade do ser humano e da família. O território do homem, seja ele camponês, tribal ou urbano é marcado por simbolismo que se materializa por meio de objetos e rituais, pelo o que é meu e o que é do outro (Ekambi-Schmidt, 1974).

Nesse sentido nosso lar pode ser um lugar de reviver aquilo que somos, conhecemos e temos. Um lugar íntimo, que fornece uma imagem do passado. Também, pode ser inter-pretado como o centro de nossa vida, conotando origem e começo, esses intimamente ligados a nossa identidade. Para Tuan um lugar íntimo -a casa, por exemplo- é dotado de significado, ele se torna suporte para vivenciarmos uma experiência individual de familia-ridade, memória e identidade (Tuan, 1978).

Nossas casas abrigam nossas histórias, valores e costumes, os artefatos narram nossa roti-na e expressam nossas relação com nós mesmos e com o mundo:

No lar, os móveis como uma escrivaninha, uma poltrona, a pia da cozinha, e a cadeira de balanço na varanda são pontos ao longo de um complexo caminho de movimento que é seguido dia após dia. Estes pontos são lugares, centro para organizar mundos. Como um resultado do uso habitual, o próprio caminho adquire uma densidade de significados e uma estabilidade que são traços ca-racterísticos de lugar (Tuan, 1983, p. 200).

Ekambi-Schmidt mostra que enquanto colocamos um pouco de nós mesmos em nos-sas casas estamos alimentando o que ela chama de alma da casa: “A alma da casa (…) é em realidade o resultado de uma apropriação sutil do espaço por seus ocupantes que as impregnam com seu ser, com suas concepções de vida, com seu modo de viver” (Ekambi-Schmidt, 1974, p. 22)

Assim também constataram Csikszentmihalyi & Rochberg-Halton (1981) em estudo publicado no livro O significado das coisas: símbolos domésticos e o eu, a casa é um ambiente emocional constituído por um grupo de objetos que são meios de expressão e afirmação de nossa identidade para o outro e para nós mesmos. Os autores explicam que:

Apesar de vivermos em ambientes físicos, nós criamos ambientes culturais com eles. Nós continuamente personalizamos e humanizamos um dado ambiente com o intuito de nos adaptar a ele criando ordem e significado (Csikszentimihal Yi e Rochbeng-Halton, 1981, p. 121).

Duarte acrescenta que “quando ocorre adoção de afeto ao Lugar, quando vão sendo construídos sentimentos de pertencimento e aparecem ações de apropriação simbólica do espaço, o indivíduo está moldando um lugar para si enquanto reconstrói sua própria identidade” (Duarte, 2013, p. 31).

Auguste Comte (Halbwach, 1990), defende que o equilíbrio mental decorre, do fato dos artefatos do nosso cotidiano mudarem pouco e nos proporcionarem uma imagem de permanência e estabilidade. O autor compara esses objetos a uma sociedade silenciosa e imóvel, estranha a nossa agitação e mudanças de humor e, como tal, responsável pela transmissão das sensações de ordem e quietude. Ele argumenta que existe uma estreita relação entre as pessoas e as coisas que lhes são familiares (Halbwachs, 1990). Halbwachs ressalta que:

Nosso entorno material leva, ao mesmo tempo, nossa marca e a dos outros. Nossa casa, nossos móveis e a maneira segundo a qual estão dispostos, o arranjo dos cômodos onde vivemos, lembramnos nossa família e os amigos que víamos geralmente nesse quadro (Halbwachs, 1990 p. 132).

Os objetos, portanto, têm uma significância que vai além de seu caráter utilitário e seu valor comercial. Essa significância reside, em grande medida, na capacidade que têm os bens de consumo de carregar e comunicar significado cultural (Douglas e Isherwood, 2007).

Os produtos são encarados não só como um meio de materializar a cultura, mas também como uma maneira de transformar e promover valores culturais. “Os bens materializam tanto categorias quanto princípios e, portanto, entram no mundo culturalmente constituído tanto como objeto quanto como objetificação desse mundo. Em suma, os bens são tanto as criações como os criadores do mundo culturalmente constituído” (McCracken, 2007, p. 103).

Rafael Cardoso (2011), menciona que a forma como às pessoas interage com os artefatos têm relação com o processo de reconstituição do passado, pois a memória faz com que vivamos no presente experiências, valores e medos. No cenário da casa os artefatos antigos extrapolam a funcionalidade e são signos, indícios culturais e testemunhos de outro tempo, como bem esclarece Baudrillard (2008).

A exigência à qual respondem os objetos antigos é aquela de um ser definitivo. O tempo do objeto mitológico é perfeito: ocorre no presente como se tivesse ocorrido outrora e por isso mesmo achase fundado sobre si (Baudrillard, idem p. 83).

Ao longo da vida de uma pessoa a casa e os objetos que ali estão são ancoramentos de memória, cada espaço carrega consigo gatilhos de lembranças daquilo que já foi vivido e presenciado ali. Ela traz consigo a moldura de uma vida. E como bem define Ferreira (1998), para o idoso esse relacionamento com o espaço familiar se estreita à medida que, com o tempo, vão entrando em declínio os registros dos tempos vividos. E a permanência nesse espaço familiar minimiza os efeitos da perda de identidade.

A relação de pessoas idosas com suas casas e coisas de acordo com resultados obtidos em pesquisa qualitativa

Produtos, serviços e espaços que proporcionam ao idoso a opção de escolher onde e como deseja envelhecer já é uma realidade em países desenvolvidos e o idosos que escolhe morar sozinho vêm recebendo apoio e dando exemplo de que é possível viver só, preservando as relações sociais com amigos e familiares, mas sem dependência. As demandas relacionadas a moradia para população idosa vem sendo tema de pesquisa ao redor do mundo, nos EUA, na Europa e Canadá, o conceito denominado Aging in Place (envelhecer em um lar, na tradução livre) vem ganhando cada vez mais notoriedade. A ideia principal é proporcionar assistência para o idoso na casa em que ele escolher passar a maior parte de sua vida. A assistência inclui serviços de casa, adaptação de moradias, suporte financeiro e de saúde, tudo isso com o objetivo de garantir que o idoso tenha independência e qualidade de vida no lugar que escolheu para envelhecer

No Brasil, entretanto, a situação ainda é muito incipiente. Casos isolados estão em fase embrionária de investigação como por exemplo a Vila ConViver proposta pela Universidade de Campinas (UNICAMP) e o recente Fórum de Moradia para Longevidade, promovido por entidade não governamentais de grande representação no estado de São Paulo, o maior e mais populoso do país. Ainda assim, além de incipiente os olhares voltados a moradia do idoso ainda são restritos a estrutura física da residência.

Seguindo o pressuposto de que a casa e seus objetos são suporte para expressão de valores, identidade e ancoramento de lembranças foi elaborada uma pesquisa de base etnográfica que teve como um de seus objetivos identificar pontos valorizados pelos idosos em relação ao seu entorno construído. O estudo revelou o cotidiano dos informantes e a suas relações com suas casas e suas coisas e os pontos ao redor das suas residências.

Participaram da pesquisa nove moradores do bairro da Gávea, no município do Rio de Janeiro, de ambos os sexos com idade superior a 60 anos inseridos em diferentes arranjos domiciliares.

Baseado em observação participante e entrevista semiestruturada, o estudo produziuse registros fotográficos dos espaços e objetos mais significativos das casas dos idosos. Foram criados, também, dois instrumentos de suporte para a pesquisa: o Diário Bipolar e o Mapa Relacional.

Cada idoso participante recebeu duas visitas em sua casa. A primeira teve como principal objetivo identificar os espaços de significados e valores, e também, as atividades realizadas pelo idoso em sua casa. Assim, na primeira visita, o participante apresentava os ambientes de sua casa, mostrando os objetos e lugares preferidos e mais significativos. O participante recebeu o Diário Bipolar, no qual deveria registrar, ao longo de uma semana, os momentos positivos e negativos do seu cotidiano.

A segunda visita aconteceu, em média, uma semana após a primeira, e teve como principal objetivo identificar os espaços frequentados pelos idosos na vizinhança e às pessoas que conheciam no bairro. Nessa visita, além do roteiro de entrevista semiestrurado, o Mapa Relacional, foi usado como suporte para a conversa, nele era possível relembrar os caminhos diários, os lugares frequentados e as pessoas com as quais os idosos tinham contato no bairro.

A análise dos dados foi feita por meio de transcrição das falas e agrupamento por categorização, definidas de acordo com o significado dos lugares e objetos apresentados e fotografados.

Observouse que a casa e os artefatos participam da manutenção de dois amplos eixos da vida do idoso: identidade, ou seja, a casa e as coisas dão suporte para preservação da sua continuidade e seus valores para ele mesmo e para os outros, bem como relações sociais e familiares, a casa e as coisas como meio de manutenção de seus vínculos afetivos hoje e no passado.

Lugares e objetos que lembram seus feitos do passado

Essa categoria reúne objetos e lugares da casa escolhidos pelos informantes como forma de demonstrar o que eles fizeram e conquistaram no passado; o que faz parte de sua crença e valores e consequentemente o que ele é hoje.

Foram mostrados e fotografados artefatos e lugares que representavam uma conquista, um feito de anos atrás, um motivo de orgulho, reconhecimento ou atuação profissional. Os objetos que embasaram essa categoria foram medalhas, quadros, fotografias, lembranças de viagem, cômodos da casa, entre outros. Os lugares e artefatos apresentados estão ligados não só a conquista final, mas também a representação do sacrifício que resultou no feito apresentado.

Objetos que representam a atuação e importância profissional foram mostrados como importantes para os informantes, Dona Maria, que entregou um exemplar de um jornal de bairro que teve durantes anos com seu filho:

O jornal era distribuído gratuitamente. Juntei com o meu filho que tinha acabado de se formar e, na época, estava em uma empresa e ganhava pouco para quem tinha se formado. Cheguei para ele e falei: “Vamos fazer isso, vai ser o nosso negócio”. Fizemos primeiro um jornal com quatro folhas. É incrível por que se você pensar é só isso aqui (Dona Maria, 78). Dona Dora, que hoje não pinta mais, contou que logo depois que se aposentou pela Aeronáutica fez muitas aulas de pintura e por isso a decoração da sua casa tem os objetos que ela mesma criou. Já Dona Elza, mostrou orgulhosamente sua casa que é decorada com as suas lembranças de viagens. Dona Maria também mostrou que sua geladeira a faz lembrar as suas maiores conquistas, os lugares do mundo que já visitou, em forma de imãs. Um casal de entrevistados, que moram no mesmo apartamento há muitos anos, contou que a sala de sua casa já foi palco de muitas alegrias, risadas e também dificuldades. Eles mostraram como moraram toda a vida com seus dois filhos em um apartamento de um cômodo. Descrevendo onde cada coisa era organizada naquele tempo: “O apartamento pequeno, hoje somos eu e ele sozinhos... Criamos nossos filhos aqui com muito sacrifício. Tínhamos um sofá que abria e dormia um com a cabeça para um lado e o outro para o outro” (Dona Carmem, 78 anos).

Constatouse aqui que os objetos e espaços da casa assumem, também a função de trazer para o idoso um meio de expressar a sua identidade e reforçar para si mesmo e para o outro aquilo que faz parte da sua identidade. Os entrevistados que saíram de suas casas para morar com algum parente demonstraram algum tipo de desconforto por não terem como “comprovar” por meio de seus objetos tudo aquilo que já haviam vivido, nesses casos o sentimento de perda da identidade se mostrou muito presente.

Como bem define Ferreira, é no mundo vivido que a identidade se consolida e é no passado que os velhos às afirma, relembrando seus inúmeros papeis sociais que dão a ele a ideia do “eu” individualizado (Ferreira, 1998).

Sendo assim, novos projetos com foco em idosos podem evocar memórias do passado por meio dos artefatos e ambientes que ancoram lembranças que reforçam parte da identidade da idoso.

Lugares e objetos mediadores suas atividades favoritas

Assim como às lembranças são fundamentais para a manutenção da identidade do idoso, aquilo que fazem e valorizam no presente também desempenham importante papel na sua estabilidade emocional.

Para muitos dos entrevistados a casa é o lugar onde eles permanecem fazendo aquilo que gostam. Em casa eles ocupam o tempo realizando atividades que lhes dão prazer e praticando seus hobbies e habilidades. Alguns dos entrevistados revelaram que gostam escrever, cultivar plantas, cozinhar, ver filmes e tocar instrumentos musicais. Os artefatos e espaços aqui foram apresentados como meios de realização de sua rotina. Esses objetos e espaços trazem consigo um significado de utilidade, onde o idoso, encontra um novo caminho e significado para sua vida, seja após a saída do mercado de trabalho, a perda do cônjuge ou uma mudança de casa.

A sala e o quarto foram os lugares da casa apontados como os preferidos, pois é nele que os idosos costumam realizar as atividades que mais gostam. Dona Maria, que gosta muito de ler, elegeu seu quarto o lugar que mais gosta de ficar durante o dia:

O quarto é o lugar da minha casa que mais gosto. Porque ali em tenho tudo. Tenho o meu telefone, uma televisão enorme, tem meu livro que gosto de ler, tem meu sudoku que eu gosto de fazer. Eu vario: eu venho a sala também, mas o lugar que eu fico mais é no meu quarto (Dona MC).

Dona ML, contou que após aposentadoria ficou um pouco perdida e que escrever foi um bom caminho para dar um novo sentido para vida, por isso ela apresentou como um de seus objetos mais significativos o seu primeiro livro: “hoje eu escrevo, estou escrevendo algumas coisas e esse é um livro que já publiquei, é a história de uma mulher que veio do interior para a cidade e virou doméstica”.

Constatouse que muito da relação de significado e afeto do idoso está ligada a objetos que fazem com que ele se reconheça em seu atual contexto. Ou seja, não é só o passado que exprime sua identidade, aqui o que media às suas atividades favoritas também são valorizadas por representarem parte da construção e manutenção de sua identidade.

Sendo assim, novos projetos com foco em idosos podem promover a manutenção das atividades valorizadas por ele, ou criar novas possibilidades para realizarem atividades que gostam e que são fundamentais para sua rotina.

Lugares e objetos que lembram laços sociais e afetivos

Essa categoria reúne objetos e lugares da casa escolhidos pelos informantes por lembrarem pessoas queridas. Foram apresentados e fotografados artefatos e lugares que trazem a recordação de uma situação específica com algum familiar, um presente, uma herança ou algo que uma pessoa já falecida gostava. Foram também apresentados objetos que afirmavam a notoriedade da família, ou a honra de algum integrante. Nessa categoria foram mostrados objetos como medalhas de honra, cadeira de balanço, sala de televisão, móveis, bibelôs e outros.

A casa em si se mostrou um espaço cheio de lembranças de pessoas que já passaram pela vida dos entrevistados. Sr. André mostrou a sala da sua casa, que deixou intacta como a sua esposa, falecida a pouco tempo, decorou: “Era tudo dela aqui nessa sala. Ela escolhia e eu comprava. Tudo aqui foi ela que deixou. As coisas de religião também são dela”.

Dona Luisa, contou que mesmo não sendo religiosa guardava em sua estante o “São José de Botas”, que foi dado à família de seu pai. Ela afirmava que a imagem representava mais o seu pai do que o próprio santo: “Quando ele faleceu, mamãe me deu. É um objeto precioso de família”.

Constatouse que a casa, os objetos e até a repetição de alguns rituais estão ligados ao sentimento de continuidade da família, da presença de pessoas importantes que passaram não só pela vida, mas constituem a história da casa.

Sendo assim, novos projetos com foco em idosos podem valorizar às relações afetivas e às tradições familiares do idoso, fazendo com que os ambientes e objetos restabeleçam sua ligação com pessoas queridas.

Lugares e objetos que mediam laços sociais e afetivos

Essa categoria reúne objetos e lugares da casa que foram escolhidos pelos informantes por serem um meio de contar sobre as relações que cultivam hoje em dia. Foram apresentados objetos que são usados por pessoas que frequentam a casa com frequência, como netos, filhos e amigos. Também foram contempladas coisas que ganharam de amigos e familiares e que são símbolo da relação de carinho que cultivam atualmente.

Nessa categoria foram registrados e fotografados brinquedos dos netos, cômodos para receber visitas, louças para receber amigos e outros.

Dona Luisa, que viaja muito para visitar suas filhas que moram fora do município mostrou sua coleção e o significado dela: “Eu gosto dessas coisas, pedra, terra (…) E minha filha “nômade” sempre me dá uma pedra típica do lugar aonde ela está morando. Agora ela trouxe essa de uma cidade onde ela mora, no estado de Minas Gerais.

Constatouse que a casa e os objetos são mediadores de relações sociais do idoso e representam a forma tangível de seus laços afetivos no presente. Eles são os vestígios dos integrantes e frequentadores do espaço e consequentemente das relações estabelecidas e mantidas pelo dono da casa.

Sendo assim, novos projetos com foco em idosos podem estimular a manutenção dos vínculos afetivos e promover a criação de novas relações sociais.

Conclusões

A casa para o idoso pode ser elencada como um espaço de significados que com o passar do tempo se torna um meio de expressão daquilo que ele já foi um dia, da sua história e do que ele é hoje. Além de ser um espaço que preserva a sua essência, seus valores e sua rotina. Ou seja, lugar de segurança, conforto e estabilidade para aquele que necessita preservar seu espaço no mundo.

Ao longo do tempo diversos autores contribuíram para o entendimento de que o envelhecimento é um processo biológico, social, cultural, individual e múltiplo (Beavoiur, 1990; Goldemberg, 2013; Debert, 1999). Portanto, as formas de morar devem ser tão plurais quanto esse processo. Para atender de forma eficiente toda a população que envelhece um denominador comum pode auxiliar a construção de ambiente mais adequados e acolhedores para essas pessoas. Às novas forma de morar que surgirão à partir da demanda dessa crescente população devem estar em consonância com aquilo que promove o bem-estar do idoso. Este bem-estar, por sua vez, segundo entrevistas realizadas, parece e deve levar em consideração seus laços afetivos, a sociabilidade, a promoção de atividades que valorizam, e acima de tudo a sua identidade, pois são esses fatores que determinam a estabilidade emocional do idoso.

Os profissionais de design e a arquitetura que se propuserem a desenvolver projetos (produtos, serviços e moradia) devem desenvolver um olhar mais cuidadoso, centrado no usuário, para criar soluções tão plurais quanto às necessidades, demandas e desejos dos maiores de 60 anos. Apesar de parecer redundante a recomendação deste artigo, é importante destacar que ela deve ser vista não como um fim (um produto final para velhos), mas como um meio de atuar que exige de todos os profissionais que -inevitavelmente vão trabalhar “com” e “para” idosos- novas posturas, considerações e o desenvolvimento do processo empático. Acreditase que um olhar atento e interdisciplinar as diversas bibliografias sobre idosos e uma predisposição para inovar no processo metodológico, inerentes ao campo de trabalho dos arquitetos e designers, podem aproximar estes profissionais de uma realidade particular e valorizada por cada idoso, que venha ser usuário de projetos de moradia.

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Recebido: 01 de Fevereiro de 2019; Aceito: 01 de Julho de 2019; : 01 de Setembro de 2020

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